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Vacinas

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1 - Introdução

No século XVIII, Edward Jenner, observou que a varíola bovina (vaccinia) parecia conferir proteção contra a varíola humana. A partir desta observação ele consegue demonstrar em 1796 que a varíola bovina conferia proteção a varíola humana dando o nome a este procedimento de vacinação, o sopro de vida inicial da imunologia como ciência. Vacinação é o termo usado para a inoculação de agentes patogênicos atenuados em animais e pessoas sadias. Quase duzentos anos se passaram até que finalmente, em 1979, a OMS anunciou   a erradicação da varíola. Edward Jenner não sabia da existência de agentes patogênicos, fato provado cerca de 100 anos mais tarde por Robert Koch. Hoje sabemos que há pelo menos 4 tipos de agentes patogênicos: vírus, bactérias, fungos e eucariotos complexos conhecidos como parasitos. 

A descoberta de Koch estimulou a busca de vacinas para outras doenças infecciosas levando a projeção de uma vacina contra a cólera aviária por Louis Pasteur e o desenvolvimento de uma vacina antirrábica. Uma década depois de Pasteur, nos anos 1890, Emil von Behring e Shibasaburo Kitasato descobriram anticorpos em animais através da descrição da atividade antitóxica do soro que era capaz de conferir proteção de curto prazo contra toxinas da difteria e tétano em humanos. 

As pesquisas iniciais e os resultados de sucesso obtido por estes cientistas abriram novos caminhos para a imunização em massa de animais e seres humanos. Foram desenvolvidas vacinas preventivas para imunização ativa contra muitas doenças que já assombraram a humanidade. Também possibilitou o desenvolvimento de soro para imunização passiva através da transferência de anticorpos produzidos em outras espécies. Sabemos hoje que a imunização ativa estimula a seleção de clones de linfócitos T e B contra um antígeno específico e pode conferir proteção contra agentes patogênicos por um período maior que a imunização passiva, pois esta não gera resposta de memória, apenas confere proteção pela transferência de anticorpos produzidos por imunização ativa em outros animais. 

Nos dias de hoje já é comum testar a possibilidade de transferência de anticorpos de humanos que já tiveram a COVID-19 para imunizar passivamente pacientes em estado grave. Também há estudo com a produção de anticorpos contra SARS-COV em lhamas, um camelídeo, para uso em humanos. Esta técnica de imunização passiva, descoberta há cerca de 130 anos, ainda pode ter um papel importante enquanto ganhamos tempo para desenvolver uma vacina eficaz e segura. Vacinas eficazes induzem proteção na maioria dos indivíduos vacinados, e vacinas seguras têm poucos efeitos colaterais em comparação com a doença. 

No universo científico surgiram como resultado de pesquisas várias técnicas para a planejamento e produção de uma de vacinas. As mais comuns incluem patógenos vivos, atenuados; mortos ou inativados; toxóide; subunidade; peptídeo; vetor de DNA recombinante; e vacinas de DNA. Atualmente a pandemia da COVID-19 levou a uma corrida para desenvolvimento de uma vacina contra o SARS-COV-2 utilizando técnicas diferentes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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1.1 Estado da arte: vacina contra SARS-COV-2

Ad5-nCoV

A equipe da CanSino Biologics co-financiada pelo National Key R&D Program of China e National Science and Technology Major Project começou a desenvolver uma vacina vetorial utilizando adenovirus-5 projetado para expressar a glicoproteína Spike do coronavírus e ao mesmo tempo modificado para não replicar no organismo. Em artigo publicado em maio de 2020 no periódico The Lancet apresentaram o resultados obtidos da Fase I. A conclusão foi que a vacina para a COVID-19 com vetor Ad5 era tolerável e imunogênica 28 dias após a vacinação. As respostas humorais contra SARS-CoV-2 atingiram o pico no dia 28 pós-vacinação em adultos saudáveis, e respostas rápidas de células T específicas foram observadas a partir do dia 14 pós-vacinação. Estes resultados levaram ao avanço da pesquisa para a fase II. A Conclusão da fase II publicada 20 de julho no mesmo periódico concluiu que a vacina Ad5-nCoV em 5 × 1010 partículas virais é segura e induziu respostas imunes significativas na maioria dos voluntários após uma única aplicação. A imunização de dose única com a vacina induziu rápido início de respostas imunes em 14 dias e respostas imunes humorais e celulares significativas em 28 dias na maioria dos receptores. Um estudo multicêntrico internacional, randomizado, duplo-cego e controlado de eficácia de fase 3 está em andamento para avaliar melhor a eficácia da vacina. 

 

Oxford-AstraZeneca’s ChAdOx1-nCov19

Esta vacina foi desenvolvida utilizando como vetor um adenovírus de chimpanzé (ChAdOx1 nCoV-19) que expressa a proteína spike SARS-CoV-2. O estudo foi feito em comparação com uma vacina de proteína meningocócica conjugada (MenACWY) utilizada como controle. A vacina foi segura e tolerada, com reduzida reatogenicidade quando paracetamol foi usado profilaticamente nas primeiras 24 horas após a vacinação. A reatogenicidade foi reduzida após uma segunda dose. A resposta celular à proteína spike de SARS-CoV-2 foi induzida em todos os participantes em 14 dias e a resposta humoral  atingiu o pico no 28o dia. Anticorpos neutralizantes foram induzidos em todos os participantes após uma segunda dose de vacina. Após duas doses, uma resposta celular potente e imunogenicidade humoral estava presente em todos os participantes do estudo. 

Um ensaio clínico de Fase 3 em vários locais, avaliando uma vacina COVID-19 experimental conhecida como AZD1222, foi iniciado. O ensaio envolveria aproximadamente 30.000 voluntários adultos em 80 locais nos Estados Unidos para avaliar se a vacina candidata pode prevenir a COVID-19. A fase 3 estava sendo desenvolvida em “velocidade de dobra espacial” (WARP speed) foi suspensa em 08 de setembro de 2020.

 

mRNA 1273 (Moderna)

O mRNA-1273 é uma vacina de mRNA contra a codificação COVID-19 para uma forma estabilizada de pré-fusão da proteína Spike (S), que foi co-desenvolvida pela Moderna e investigadores do Centro de Pesquisa de Vacinas do NIAID. 

 

PiCoVacc de Sinovac

A partir de 11 amostras coletadas (5 da China, três da Itália e uma amostra da Suiça, uma dos EUA e uma da espanha). As amostras continham cepas SARS-CoV-2 amplamente espalhadas na árvore filogênica construída a partir de todas as sequências disponíveis, representando em certa medida as populações circulantes de SARS-CoV-2. A cepa CN2 foi escolhida para desenvolver uma vacina purificada do vírus SARS-CoV-2 inativado, PiCoVacc, e outras 10 cepas, CN1, CN3 a CN5 e OS1 a OS6, como cepas de desafio pré-clínico. As cepas CN1 e OS1 estão intimamente relacionadas a 2019-nCoV-BetaCoV Wuhan / WIV04 / 2019 e EPI_ISL_412973, respectivamente, que foram observados sintomas clínicos graves, incluindo insuficiência respiratória que requer ventilação mecânica.

 

INO-4800 (Inovio)

A Inovio empregou uma abordagem de vacina baseada em DNA sintético. As vacinas de DNA sintético são passíveis de cronogramas de desenvolvimento acelerado devido à capacidade de criar rapidamente vários candidatos para testes pré-clínicos, fabricação escalonável de grandes quantidades do medicamento e a possibilidade de alavancar caminhos regulatórios estabelecidos para a clínica. Especificamente para o desenvolvimento de uma vacina candidata COVID-19, aproveitamos experiências anteriores no desenvolvimento de abordagens de vacinas para SARS-CoV e nossa própria experiência no desenvolvimento de uma vacina MERS-CoV (INO-4700), bem como aproveitando de nosso projeto de vacina e caminho de fabricação anteriormente utilizado para a vacina candidata contra o zika, GLS-570011, que foi encaminhada para a clínica em menos de 7 meses. As vacinas INO-4700 e GLS-5700 estão atualmente em testes clínicos.

A proteína Spike de SARS-CoV-2 é mais semelhante em sequência e estrutura à proteína Spike de SARS-CoV e compartilha uma arquitetura de dobra de proteína global com a proteína Spike de MERS-CoV, permitindo-nos desenvolver o projeto de construção de vacina anterior. Ao contrário das glicoproteínas do HIV e da influenza, a forma de pré-fusão do Spike trimérico do coronavírus é conformacionalmente dinâmico, expondo totalmente o local de ligação ao receptor com pouca frequência. O local de ligação ao receptor é um alvo vulnerável para nAbs (anticorpos neutralizantes). Na verdade, os nAbs MERS direcionados ao domínio de ligação ao receptor (RBD) tendem a ter maior potência neutralizante do que outros epítopos. Um relatório recente demonstrou que um anticorpo anti-SARS pode apresentar reação cruzada com o RBD do SARS-CoV-2. Esses dados sugerem que o SARS-CoV-2 RBD é um alvo importante para o desenvolvimento de vacinas. Dados recentes revelaram que a proteína SARS-CoV-2 S se liga ao mesmo receptor do hospedeiro, a enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2), que a proteína SARS-CoV S.

 

2 - Planejamento de uma vacina

O que leva ao desenvolvimento de uma vacina eficaz, segura e de baixo custo? Para desenvolver uma vacina é necessário levar em consideração alguns fatores para alcançar o objetivo de imunização em massa com sucesso. Esses fatores incluem a natureza do patógeno, a eficácia e a segurança da vacina.

 

2.1 Natureza do Patógeno

Várias características bioquímicas do patógeno podem ter uma grande influência no sucesso de uma vacina. Patógenos que causam doenças agudas são tecnicamente bons candidatos ao desenvolvimento de uma vacina, pois causam uma resposta de defesa vigorosa que deixa os sobreviventes com imunidade duradoura e até mesmo permanente.  Uma vacina derivada de tal patógeno provavelmente induzirá um nível similar de imunidade protetora. Um patógeno que causa doenças crônicas por infecção natural é tipicamente inadequada para eliminar o patógeno. Portanto, a chance de sucesso na obtenção de uma vacina pode ser comprometida por não estimular uma resposta protetora em um vacinado.

Tentativas de produção de vacina contra protozoários do gênero Leishmania tem falhado pois há uma interação entre patógeno-hospedeiro que leva a tolerância do parasito levando a uma doença crônica na infecção natural e gera uma resposta ineficaz à vacinação. As tentativas de desenvolvimento de vacinas contra a malária, causada pelo Plasmodium spp tendem a falhar devido a troca constante dos componentes bioquímicos de superfície (antígenos) do parasito devido a recombinação gênica. O HIV apresenta um desafio adicional e único no projeto da vacina porque este vírus ataca e destrói a população de células TCD4+ do indivíduo.

Os agentes patogênicos que apresentam um baixo grau de variação antigênica (por exemplo, o vírus do sarampo) são favorecidos como candidatos à vacina porque as células B e T de memória, plasmócitos (linfócito B) produtores de anticorpos e células T efetoras (TCD8+) e T auxiliares (TCD4+) continuarão a reconhecer o patógeno em exposições sucessivas.

Um programa de vacinação tem por objetivo erradicar completamente um patógeno de uma população de forma que a vacinação não seja mais necessária. É um objetivo quase de ficção científica, se considerarmos que até o momento apenas duas doenças foram consideradas eliminadas: a varíola humana e a peste bovina. Deste  ponto de vista, os melhores candidatos são patógenos que infectam apenas humanos, ou apenas uma espécie animal o que significa que eles não podem ter um reservatório ambiental selvagem em outra espécie. Podemos citar como exemplo a leishmaniose que possui um reservatório natural em roedores que vivem no ambiente selvagem geralmente na copa de árvores. O desmatamento causa a fuga desses animais e os insetos vetores se adaptam a espécie humana e em cães domésticos levando a um ciclo urbano. Mesmo que consigamos uma vacina eficiente e segura contra a leishmaniose, sempre haverá, enquanto houver florestas, um reservatório do agente patogênico. A complexidade da leishmaniose é ainda maior quando observamos que humanos portadores de HIV que desenvolveram a AIDS apresentaram leishmaniose fora de áreas endêmicas, mas com histórico de passagem por regiões tropicais onde a doença é ativa. Estes pacientes viviam em equilíbrio com parasito sem apresentar sintomas da doença, mas como as células TCD4+ destruídas o balanço da resposta que mantinha o parasito sobre controlado foi quebrado.

Portanto, quando houver um reservatório e um programa de vacinação for encerrado, surgirá uma nova geração de indivíduos ou animais suscetíveis. Do ponto de vista da erradicação os esforços são frustrados.  


 

2.2 Eficácia

A eficácia de uma vacina consiste em conferir proteção aos vacinados, sendo adequada para eliminar um determinado patógeno alvo. Considerando um patógeno extracelular, é de se esperar que desenvolva uma resposta B efetiva, uma vez que anticorpos com isotipo adequado como por exemplo, em humanos, IgA protege melhor as mucosas enquanto IgG confere proteção no tecido sanguíneo. Por outro lado, para patógenos intracelulares espera-se de uma vacina a capacidade de desencadear resposta de linfócitos TCD8+.

A eficácia de uma vacina é expressa como a porcentagem de vacinados que após exposição não apresentam a doença. Devido a variação genética entre os vacinados, nenhuma vacina ainda foi capaz de atingir 100%. As vacinas de uso humano administradas na infância chegam a 80-95% e o restante da população (5-20%)  acabam se beneficiando da imunidade coletiva ou popularmente chamada de imunidade de rebanho, pois diminui a chance de contaminação dos indivíduos que não responderam a vacinação. Também há o conceito Cocooning que consiste na imunidade coletiva em pequena escala, como por exemplo, vacinar membros de uma família (contatos domiciliares) onde há um indivíduo vulnerável.

 

2.3 Segurança

Uma vacina não deve causar a doença e ter poucos efeitos adversos como vermelhidão e sensibilidade no local da aplicação, febre alta convulsões, pneumonia, encefalite e morte. O custo benefício deve ser considerado em populações com alta incidência da doença onde o risco é menor que o benefício e a vacinação deve ser recomendada. Em populações de baixo incidência da doença, a vacinação em massa seria desaconselhável pois o risco de dano da vacina seria maior que o benefício.

Para ser considerada segura a vacina antes da aplicação em massa deve passar por testes pré-clínicos e clínicos. Os testes em culturas de células ou modelos animais são pré-clínicos e os ensaios clínicos são feitos em voluntários e é dividido em fases:

Fase I: realizado com um pequeno número de voluntários onde será avaliada a imunogenicidade, ensaio de dose-resposta, via de administração ideal e eventos adversos na ausência de qualquer infecção. 

Fase II e III: avaliam ainda mais a eficácia da vacina em grupos cada vez maiores de voluntários que recebem a vacina e, em seguida, são desafiados com o patógeno. 

 

Fase IV: após passar pela fase III é monitorada sua eficácia, e efeitos colaterais danosos. A coleta de dados pela vigilância sanitária (ANVISA) através de notificações pelo sistema de saúde é uma importante fonte de informação para quem tem preocupação sobre segurança para se vacinar e vacinar seus filhos.

Dependendo do agente patogênico pode não estar disponível um modelo animal o que impedirá os estágios iniciais da pesquisa. Além disso, o desafio de aplicar o patógeno após a vacinação para determinar sua eficácia em voluntários com um agente altamente patogênico (por exemplo SARS-Cov2, HIV, etc) seria antiético. 

O ensaio clínico então é feito com a administração da vacina candidata em indivíduos que já vivem em uma área onde o patógeno é endêmico. Os pesquisadores rastreiam as mudanças na incidência da doença e comparam com um grupo controle que não foi imunizado e que vive na mesma área. Na pandemia da COVID-19, o mundo será  um grande laboratório de testes.

3 - Tipos de vacinas

Observe que os tipos de vacinas que funcionam melhor para uma classe de patógeno podem não funcionar para outra.

3.1 Vacinas Vivas Atenuadas

Uma vacina viva atenuada consiste na utilização de bactérias ou vírus que são manipulados em laboratório para reduzir sua patogenicidade e simultaneamente manter sua capacidade de gerar resposta de defesa celular e humoral. O patógeno é capaz de multiplicar e uma elevadas quantidades de imunógenos são produzidas no vacinado desencadeando a resposta inata inicialmente capaz de estimular a resposta adquirida através da seleção de clones de linfócitos B e linfócitos T.

As vacinas vivas atenuadas geralmente são muito eficazes, mas uma única dose geralmente não é suficiente para induzir a imunidade de longa duração. Um reforço (dose repetida de vacina) geralmente deve ser administrado para induzir respostas imunológicas secundárias mais rápidas e mais fortes e reforçar a proteção. As vacinas vivas atenuadas devem ser mantidas em refrigeração desde a produção até a administração e isto pode ser uma desvantagem devido a elevação do custo com logística.

As alterações que atenuam um patógeno foram realizadas principalmente pelo estudo de meios de cultura incomuns por períodos prolongados. Um exemplo de período prolongado foi a atenuação do BCG (bacilo Calmette-Guérin) que foi mantido durante 13 anos em meio de cultura saturado de bile e levou a criação da vacina BCG em 1921 por Léon Calmette e Alphonse Guérin. A atenuação tornou o Mycobacterium bovis incapaz de causar a infecção, sendo seguro para vacinação em massa. A vacina BCG é a única utilizada para prevenção da tuberculose infantil causada principalmente pelo Mycobacterium tuberculosis (Marina A. Forrellad, et. al 2012) e que afeta â…“ da população mundial (WHO, 2019). Hoje ainda, a vacina BCG é o único tipo de imunização contra a doença e deve ser tomada em dose única, preferencialmente nas primeiras 12 horas após o nascimento, ou até quatro anos de idade, se a criança nunca tiver sido vacinada (Brasil, 2020). As alterações do M. bovis em cultura até hoje não foram muito bem compreendidas. Um estudo indicou que o principal mecanismo de atenuação do bacilo Calmette-Guérin é a perda da atividade citolítica mediada pela secreção do ESAT-6 (alvo antigênico secretor precoce de 6 kDa) , que resulta em redução da invasão tecidual (Tsungda Hsu, et al., 2003). Marina A. Forrellad e colaboradores (2012) fizeram uma revisão mostrando os estudos com pelo menos 9 pontos fatores de virulência identificados:

(1) Metabolismo de lipídeos e ácidos graxos, incluindo catabolismo de colesterol, 

(2) proteínas do envelope celular: incluindo proteínas da parede celular, lipoproteínas e sistemas de secreção, 

(3) proteínas que inibem a resposta efetora de macrófagos, incluindo espécies reativas de oxigênio (ROS) e espe´cies reativas de nitrogênio (NO), retenção de fagossomo e inibição de apoptose, 

(4) proteínas quinases, 

(5) proteases, incluindo metaloproteases, 

(6) proteínas transportadoras de metal, divididas em importadores e exportadores, 

(7) reguladores de expressão gênica;

(8) proteínas de função desconhecida, incluindo famílias PE e PE_PGRS e 

(9) outras proteínas de virulência.

O conhecimento dos fatores de virulência é de suma importância para o desenvolvimento de vacinas e fármacos para alcançarmos um mundo livre de tuberculose que globalmente, onde cerca de 10,0 milhões (variação, 9,0-11,1 milhões) de pessoas adoeceram em 2018.

 

Exemplos de atenuação em organismo diferente do hospedeiro:

  1. Pasteurella hemolytica e a P. multocida: obtida por manipulação genética que crescem na dependência de estreptomicina

  2. Peste bovina (morbilivírus) família Paramyxoviridae: atenuação obtida em coelhos e vacina obtida através do cultivo tecidual

  3. Peste equina africana: atenuação obtida em camundongos

  4. Cinomose canina: atenuação obtida em furões ou Cultivada em células renais caninas, pois o alvo de ataque são preferencialmente células linfóides

  5. Raiva: passagem em ovos

 

3.2 Vacinas mortas

O tratamento com irradiação gama ou um agente químico como o formaldeído podem matar ou inativar bactéria, parasita ou vírus para produção de vacinas. Os procedimentos devem preservar a estrutura dos epítopos que são potenciais alvos do sistema de defesa que geram resposta protetora, e simultaneamente eliminam a replicação e a virulência patógeno. As vacinas obtidas por estes processos são mais estáveis que as vacinas vivas. Como os patógenos não podem se replicar, quantidades maiores de antígenos devem ser administradas na dose primária, aumentando os custos. Além disso, como o patógeno está morto, desencadeiam uma inflamação menos intensa do que as vacinas vivas e a resposta a uma determinada dose é mais fraca e são necessários reforços frequentes. Como o organismo está morto, ele não pode penetrar ativamente nas células do hospedeiro, sendo limitante quando o patógeno é naturalmente intracelular. Não ocorre a selelção de clones de linfócitos TCD8+.

A apresentação de antígenos por uma célula dendrítica que fagocita a vacina morta pode apresentar peptídeos derivados dela, mas os níveis de peptídeo-MHC classe I gerados ativam apenas um número limitado de células TCD8+. Haverá um predomínio da indução da resposta humoral sistêmicas com anticorpos neutralizantes, que não é muito eficaz contra patógenos intracelulares.

 

3.3 Toxóides

Uma patógeno que desencadeia uma doença através de produção de exotoxinas pode ser candidata a uma vacina inteiramente contra estas moléculas. Após o tratamento químico de uma exotoxina, geralmente por formalina, elas perdem a toxicidade porém retem sua capacidade de gerar uma resposta de defesa  por anticorpos neutralizantes. A vacinação ou reforço com toxóide tetânico protege contra esta doença por pelo menos 5 anos. A difteria também é um exemplo de vacinação pela administração de toxóides.

 

3.4 Vacinas de subunidade

Proteína ou polissacarídeo purificado de um patógeno e que contém pelo menos um epítopo protetor são exemplos de subunidades que geram proteção. Uma grande vantagem dessas vacinas é evitar qualquer risco de reversão de patogenicidade e efeitos colaterais devido a componentes patogênicos irrelevantes.

 

3.4.1 Vacinas de subunidade de proteína

Técnicas convencionais de purificação de proteínas podem ser utilizadas para isolar uma subunidade de patógeno contendo um epítopo, embora sejam técnicas trabalhosas e de baixa eficiência que elevam o custo de produção de vacinas. A técnica de clonagem de DNA em plasmídios bacterianos diminuem drasticamente o custo de produção de uma proteína possibilitando até a produção de proteínas de organismos de difícil replicação em meio de cultura. A partir do gene que pode ser obtido a partir de um mRNA através da construção de uma biblioteca de cDNA em organismos fácil replicação em laboratório como levedura ou Escherichia coli.

Esses microrganismos são facilmente cultivados em grandes volumes no laboratório, e a proteína é sintetizada em quantidades correspondentemente altas junto com outras proteínas microbianas. Geralmente é utilizado uma proteína de fusão ou uma calda de 6 aminoácidos histidinas que podem ser purificados a partir de ligação a uma coluna cromatográfica de níquel separando a proteína alvo das proteínas do microrganismo utilizado na sua produção. Um litro de cultura de E. coli pode render proteína para produzir 4.000.000 de doses de vacina contendo a partícula viral VP1 para proteção contra febre aftosa bovina. Em outras palavras com 25 litros de cultivo de E. coli é possível produzir 100 milhões de dose da vacina.

Uma desvantagens desta técnica consiste na incapacidade destas proteínas em penetrar as células do hospedeiro o que limita a resposta para organismos extracelulares como resposta humoral (anticorpos) e respostas TCD4+, falhando na seleção de clones TCD8+ (dependente da apresentação de antígenos pelo MHC-I) que é a principal resposta para patógenos intracelulares. Outra desvantagem é o dobramento da proteína pelo organismo heterólogo utilizado na produção que leva a produção de epítopos que não geram resposta adequada e portanto falha na proteção do vacinado.

 

3.4.2 Vacinas de subunidade de polissacarídeo 

Quando um polissacarídeo é importante para a virulência do patógeno, como acontece com muitas bactérias encapsuladas, podemos considerar a utilização desta subunidade para produção de vacina. Polissacarídeos da cápsula são abundantes nas superfícies bacterianas e fáceis de purificar. Além disso geralmente não induzem efeitos colaterais quando injetados em animais ou humanos. Os polissacarídeos não fornecem epítopos de células T, que são estimuladas exclusivamente por peptídeos resultantes da hidrólise de proteínas do patógeno. 

A conjugação de um polissacarídeo com uma proteína transportadora pode aumentar a eficácia de uma vacina pois fornece um epítopo de célula T, criando uma vacina conjugada. As toxinas tetânica e diftérica são frequentemente utilizadas como transportadores em vacinas conjugadas. Há também um transportador resultante da modificação da toxina diftérica, o CRM197, utilizado na produção de vacinas contra bactérias encapsuladas como Haemophilus influenza, pneumococcus e meningococos.

3.4.3 Vacinas conjugadas

As Vacinas Conjugadas foram desenvolvidas para induzir uma resposta imune robusta contra polissacarídeos da capsulares bacterianos (CPSs). Os CPSs são polímeros longos compostos de muitas unidades repetidas de açúcares simples e servem como uma camada externa protetora para muitas bactérias. Centenas de polissacarídeos imunologicamente (e quimicamente) diferentes podem ser sintetizados pelas bactérias. Vacinas produzidas a partir de polissacarideo de pneumococos e meningococos produzidas na década de 1970 eram capazes de induzir a produção de anticorpos em adultos mas falhavam na indução em crianças, faixa etária que mais precisavam de proteção. Neste período ninguém havia notado ainda o trabalho de Avery & Goebel (1929) que mostrou que a gluco-globulina de cavalo e gluco-ovalbumina estimulavam fortemente a produção de anticorpos.. Uma década depois, em 1980, John Robbins e Rachel Schneerson do National Institutes of Health (Bethesda, Maryland), e David Smith e Porter Anderson (Rochester, Nova York), descobriram este estudo independentemente e desenvolveram uma vacina conjugada contra o H. influenza tipo B (Hib), que funcionou perfeitamente em bebês e crianças. 

3.5 Vacinas peptídicas

Peptídeos podem ser produzidos em organismo heterólogo da mesma forma que que produz proteínas. Epítopos peptídeos podem estimular tanto células T quanto B gerando resposta de proteção. A vantagem desta técnica é conhecer exatamente a composição da vacina e não haver nenhuma possibilidade de causar doença ao vacinado. Devido ao tamanho reduzido do peptídeo dificilmente toxinas serão encontradas como contaminantes. Um peptídeo natural que não é imunogênico, poderá ser modificado em laboratório para se tornar imunogênico. Neste caso após a purificação é necessário a adição de um adjuvante que vai estimular a absorção pelas APCs. O peptídeo poderá então ser apresentado de forma cruzada  para células TCD4+ e TCD8+ virgem, respectivamente, associados ao MHC de classe II e classe I.

As vacinas de peptídeos têm seu próprio conjunto de desvantagens. Como os peptídeos são por definição curtos, os epítopos contidos em tais vacinas tendem a ser pequenos, lineares e não conformacionais. No entanto, a maioria dos epítopos de células B em um patógeno completo são conformacionais, de modo que os anticorpos produzidos em resposta a uma vacina de peptídeo podem oferecer proteção apenas limitada durante uma infecção natural. 

Um passo importante no desenvolvimento de vacinas peptídicas é verificar medir a constante de dissociação (Kd) que fornece dados de afinidade entre o peptídeo(s) e anticorpo(s) presente no soro do paciente. Por outro lado a determinação do Kd com o TCR é mais complexo, pois o receptor dos linfócitos T reconhecem o conjunto MHC, que está apresentando o antígeno, e o antígeno como um conjunto (Figura 20.1). O sucesso da interação MHC-Antígeno-TCR depende da variabilidade do MHC do indivíduo ou animal vacinado. A ligação do peptídio a uma proteína carreadora pode aumentar a resposta de defesa como descrito para os polissacarídeos.

3.6 Vacinas de DNA

A vacinação de DNA envolve a introdução em um vacinado de sequências de DNA derivadas de patógenos que dirigem a síntese de proteínas de patógenos imunogênicos in vivo. As vacinas de DNA incluem vacinas de vetor recombinante e vacinas de DNA nu. Embora algumas vacinas de DNA estejam agora licenciadas para imunizações veterinárias, nenhuma ainda se mostrou adequada para vacinação humana devido à baixa imunogenicidade em comparação com as vacinas de proteína correspondentes.

3.6.1 Vacinas de vetor recombinante

Uma vacina de vetor recombinante é desenvolvida a partir de uma bactéria ou vírus atenuado que não tem relação com a doença que se almeja a imunização em massa. Estes vetores podem invadir as células do hospedeiro e até replicar, mas não causam nenhuma doença. Os vetores carregam genes que ao serem expressos levam a produção de proteínas, ou seja, antígenos capazes de desencadear uma resposta de proteção contra o patógeno alvo.

Se a infecção ocorrer em uma célula dendrítica do hospedeiro a proteína produzida entra na linha de degradação fisiológica como proteínas endógenas. Os fragmentos gerados no citoplasma serão apresentados às células T através do MHC-I ativando e selecionando um clone de linfócito T citotóxico (TCD8+). Caso a célula hospedeira libere a proteína poderá ocorrer dois processo: 1) estímulos direto de linfócitos B (sem apresentação de antígenos) e 2) captação da proteína por células dendríticas que será processada como proteína exógena e apresentada pelo MHC-II que desencadeia uma resposta T auxiliar (TCD4+). 

Um vetor recombinante bastante utilizado é o vírus vaccinia que possui genes não relacionados com o processo de invasão e replicação da célula hospedeira. Com isso é possível fazer substituições de genes no genoma do vírus com DNA de um organismo patogênico heterólogo capazes de serem expressos em mRNA que serão traduzidos em proteínas pelos ribossomos gerando antígenos protetores contra o patógeno alvo. 

O adenovírus humano e de chimpanzé tem sido usado no desenvolvimento de vacinas contra o vírus Ebola e SARS-COV-2. O adenovírus possui a vantagem de ser facilmente cultivado em laboratório e carregam grandes quantidades de genes heterólogos sem afetar sua replicação. Estes vírus são mais eficientes que a vaccinia pois entram facilmente nas células de mamíferos e isto confere uma característica imunogênica capaz de desencadear uma vigorosa resposta TCD8+.

A desvantagem destes vetores é que o hospedeiro pode desenvolver anticorpos contra o vetor viral não relacionados à proteção contra o patógeno. Este tipo de resposta limita uma segunda dose ou reuso do vetor para outros componentes ou para uma vacina contra outros patógenos. Um eventual reforço (segunda dose) não teria efeito pois seria neutralizado antes de acessar a célula do hospedeiro. Para resolver isto no desenvolvimento da vacina contra SARS-COV-2 os russos utilizaram linhagens diferentes de adenovírus: um para a primeira dose (adenovírus 26 - Ad26) e um para a segunda dose (adenovírus 5 - ad5) da vacina Sputnik V.

Esta limitação também pode ser resolvida se a primeira dose for feita com vetor recombinante e a segunda sem vetor, como por exemplo utilizando uma vacina de subunidade que não contém um vírus como transportador. 

 

3.6.2 Vacinas de DNA nu

O DNA nu se refere a um plasmídeo, que é um DNA circular geralmente associado a resistência de bactérias, por exemplo, aos antibióticos como penicilinas e cefalosporinas. O plasmídeo é facilmente replicado em bactérias como Escherichia coli colocando pressão de antibiótico. Em outras palavras, a presença do antibiótico no meio de cultura facilita a replicação do DNA plasmidial em grandes quantidades. As bactérias são lisadas e na sequência o plasmídeo é isolado (purificado) e utilizado na produção da vacina. No vacinado o plasmídio absorvido pela célula passa a expressar proteínas do patógenos que possibilitam o desenvolvimento de proteção através das célula T (citotóxica e auxiliar) e também resposta de células B.

Essas vacinas são difíceis de administrar com eficiência. A possibilidade de  integração do plasmídeo no genoma da célula hospedeira é uma grande preocupação, com o risco de alterar o genoma e levar ao desenvolvimento de neoplasias como observado em em pesquisa com animais. Pesquisa têm sido realizadas mostrando vária maneiras de zerar este risco de integração, além de pesquisas que visam melhoria na entrega do DNA nu às células hospedeiras.

4 - Adjuvantes

4.1 Alúmen

Embora vários adjuvantes estejam disponíveis para uso em animais experimentais, até recentemente, o único adjuvante licenciado para uso rotineiro em humanos era o alúmen. Alum é um gel que contém sais de hidróxido de alumínio ou fosfato de alumínio. A injeção de alumínio induz inflamação que tende a promover respostas Th2 e imunidade humoral em vez de respostas Th1 e imunidade mediada por células. Porém, mesmo após 80 anos de intensas pesquisas, ainda não se sabe exatamente como funciona esse agente. Não parece que a administração de alúmen desencadeia a sinalização TLR, ao contrário de algumas outras substâncias utilizadas historicamente (ver mais adiante). O uso de sulfato de alumínio não é totalmente isento de desvantagens, porque normalmente é injetado profundamente no músculo. Essa abordagem garante que os vacinados (crianças, em particular) sejam devidamente vacinados, mas aumenta o desconforto dos vacinados. As reações locais incluem vermelhidão de curta duração, dor e endurecimento do tecido no local da injeção. Em alguns casos, também podem ocorrer reações sistêmicas como mal-estar, febre e dores.

4.2 Adjuvantes à base de óleo ou lipídio

Nos últimos anos, alguns adjuvantes sem alúmen foram aprovados para uso em vacinas contra influenza sazonal na Europa. Um deles é denominado “Sistema adjuvante 04” (AS04) e consiste em monofosforil lipídio A (derivado de LPS de Salmonella) adsorvido em hidróxido de alumínio. Este agente, que é um ligante de TLR-4, induz células Th1 e respostas de anticorpos; é atualmente utilizado em vacinas contra o vírus do papiloma humano (HPV) e o vírus da hepatite B (HBV). Dois outros novos adjuvantes são MF59 e AS03, que são emulsões óleo-em-água à base de esqualeno. O componente esqualeno desencadeia a internalização da emulsão pelas DCs, resultando na captação do antígeno da vacina e respostas vigorosas de linfócitos Th2 e anticorpos.

4.3 Ligantes de PRR (receptores de reconhecimento padrão)

Vários novos adjuvantes deliberadamente projetados para conter ligantes de PRR ganharam recentemente a aprovação regulatória em algumas jurisdições. Esses adjuvantes foram formulados para conter várias combinações de proteínas bacterianas, carboidratos e / ou ácidos nucléicos conhecidos por ativar leucócitos. Alguns estudos demonstraram que a inclusão de ligantes de PRR em uma vacina pode ter efeitos positivos poderosos. Por exemplo, estudos em camundongos mostraram que antígenos de L. major ou M. tuberculosis suspensos em emulsões de óleo e água induzem apenas respostas Th2 não protetoras, mas que a adição de certos ligantes PRR a esta emulsão pode desencadear respostas Th1 protetoras . Além disso, em estudos preliminares em humanos, verificou-se que as vacinas contendo ligante de TLR induzem respostas fortes de Th1, CTL, anticorpos e células NK. A flagelina ligante de TLR5 é um candidato a adjuvante particularmente atraente porque esta proteína pode ser fundida a uma vacina de proteína ou antígeno peptídico para formar uma vacina conjugada. 

Um grande problema com todas as vacinas contendo ligantes PRR é que as respostas inatas induzidas por ligantes de PRR também podem promover a ativação de linfócitos auto-reativos se não forem controlados adequadamente. A autoimunidade é, portanto, um efeito colateral (claramente indesejável) de algumas vacinas baseadas em PRR. Esforços estão em andamento para entender como esses e outros adjuvantes atuam em nível molecular, com o objetivo de desenvolver agentes que tenham poucos efeitos colaterais e afetem apenas um número limitado de tipos de células.

5 - Razões para não vacinação

No mundo em desenvolvimento, muitas pessoas não são vacinadas por desconhecimento dos benefícios, o alto custo das vacinas, uma rede de refrigeração não confiável, falta de seringas e agulhas esterilizadas, falta de clínicas de imunização e pessoal qualificado, distância geográfica das clínicas, e suspeita de motivos governamentais ou de agências de saúde. Guerras e conflitos civis bloqueiam o acesso às clínicas de imunização ou colocam os programas de vacinação no final da lista de prioridades do governo. Às vezes, a vacina não está disponível porque a doença que ela previne atinge apenas as pessoas mais pobres do mundo, dando às empresas farmacêuticas pouco incentivo financeiro para produzir a vacina apropriada. Por todas essas razões, centenas de milhares de adultos e crianças morrem de mortes evitáveis ​​por vacinação a cada ano em regiões de baixa renda.

Em países desenvolvidos, a falha na vacinação geralmente se deve a uma decisão consciente de adultos aparentemente bem-educados. Alguns desses indivíduos acreditam que a vacinação é desnecessária ou proibida por sua religião, ou que os riscos de contrair a doença não são tão grandes, ou que a vacinação entra em conflito com um estilo de vida "natural", ou que a vacina pode não ter sido testada adequadamente para segurança, ou que a própria vacina causa a doença que deveria prevenir. Além disso, devido ao sucesso da vacinação na prevenção de vários flagelos infantis, muitas pessoas não testemunharam o grau de devastação que podem causar e, portanto, não valorizam mais o valor de evitá-los. Grupos organizados anti-vacinas e defensores da medicina alternativa argumentam contra a vacinação de rotina para doenças infantis, e a chance muito pequena de uma vacina causar um evento adverso grave e amplamente divulgado pela mídia. O mais perturbador é que algumas organizações de gestão de saúde apóiam ativamente as decisões dos pais de renunciar à vacinação de seus filhos. Essas ações geraram um grupo de crianças que não foram vacinadas ou que não completaram a série de reforços necessária. Essas crianças não só não estão protegidas contra algumas doenças muito graves, mas também podem transmiti-las a membros vulneráveis ​​e desavisados ​​de suas comunidades.

6 - Consequências da não vacinação

As consequências da recusa dos pais em vacinar os filhos podem ser involuntárias e muitas vezes severas. Essas escolhas levaram aos surtos de sarampo em 1989-1991 em escolas de ensino médio nos EUA, que mataram 120 alunos. Ironicamente, a encefalopatia após a vacinação contra o sarampo ocorre a uma taxa de 1 em 106 vacinados, enquanto o risco de encefalomielite após a infecção natural do vírus do sarampo é de 1 em 103. Na Holanda em 1992, um pequeno grupo de pais recusou-se a vacinar seus filhos por motivos religiosos e sofreu um surto de 71 casos de poliomielite, com o seu fardo de paralisia permanente e morte. A decisão dos pais de não vacinar também levou a epidemias graves de coqueluche no Japão, Reino Unido e Suécia no início dos anos 1990. Em 2008, uma criança americana que não foi intencionalmente vacinada contra o sarampo expôs ao vírus mais de 800 pessoas em San Diego após pegar a doença durante uma viagem à Europa. Doze crianças não vacinadas entre esses contatos desenvolveram sarampo, e U$ 10.000 em custos de saúde, por caso, foram gastos para conter o surto. Além disso, os pais tiveram que interromper suas vidas ocupadas para manter seus filhos não imunes em quarentena por 21 dias. Em 2009, um surto de 1.500 casos de caxumba ocorreu em Nova York e Nova Jersey porque uma criança não vacinada que viajou para a Grã-Bretanha (onde mais de 7.000 casos de caxumba foram registrados naquele ano) trouxe o vírus de volta ao acampamento de verão. Da mesma forma, vários surtos de coqueluche ocorreram recentemente na América do Norte devido à falha dos pais em vacinar seus filhos, ou em completar a série de reforço. A contenção de um surto de coqueluche em Nebraska em 2008, que envolveu 26 casos iniciais, acabou consumindo quase 1% do orçamento anual do estado. Em 2010, mais de 27.000 casos de coqueluche foram registrados nos EUA, o maior número desde 1959.

 

7 - Efeitos colaterais da vacina

As vacinas evitam muita miséria e milhões de mortes prematuras em todo o mundo. No entanto, como todos os medicamentos poderosos, as vacinas apresentam um risco de efeitos colaterais. Em geral, por causa de extensos testes em animais e cultura de  células, tais riscos são baixos e os eventos adversos associados são leves e limitados a vermelhidão ou dor no local da injeção, espirros ou congestão nasal após administração intranasal, fadiga ou dor de cabeça. Em muito poucos casos, os efeitos adversos de uma vacina são mais graves.

A maioria dos países desenvolvidos realiza vigilância pós-licenciamento de eventos adversos que podem desencadear a retirada de uma vacina caso ela se mostre prejudicial mesmo em raras circunstâncias. Nos EUA, o VAERS foi estabelecido na década de 1990 pelo US CDC como um sistema passivo de coleta de dados que aceita relatórios do público sobre eventos adversos associados a vacinas licenciadas para uso nos EUA. O CDC e / ou FDA monitoram os dados do VAERS (Vaccine Adverse Event Reporting System) para detectar eventos adversos novos ou raros, bem como aumentos nos efeitos colaterais conhecidos. Esses dados também são examinados para identificar os fatores de risco do paciente para tipos específicos de eventos adversos ou para vincular um lote de vacina específico a um aumento nos efeitos colaterais prejudiciais. [Observe, entretanto, que os dados do VAERS não estabelecem uma relação de causa e efeito comprovada entre um determinado evento adverso e uma vacina.]

Um exemplo de VAERS em ação ocorreu em dezembro de 2007, quando 1,2 milhão de doses da vacina Hib foram recolhidas pelo fabricante devido à contaminação bacteriana ocorrida durante o processo de fabricação. As injeções de reforço de rotina de Hib para crianças de 12-15 meses de idade foram adiadas, mas bebês com alto risco de doença invasiva por Hib continuaram a ser vacinados. Os eventos adversos foram registrados pelo VAERS, mas uma revisão dessas entradas felizmente mostrou que nenhuma criança que recebeu a vacina contaminada desenvolveu uma infecção bacteriana.

Outro evento adverso incomum que ainda está sob investigação é a associação entre uma vacina contra influenza e narcolepsia (adormecer repentinamente em hora inadequada). Esta vacina em particular foi amplamente usada durante à pandemia de H1N1 de 2009-2010. Um estudo finlandês descobriu que havia um risco 9 vezes maior de desenvolvimento de narcolepsia em crianças e adolescentes vacinados entre as idades de 4 e 19 anos em comparação com indivíduos não vacinados da mesma idade. Populações maiores e mais países estão agora sob escrutínio.

3.5 Vacinas peptídicas

3.6 Vacinas de DNA

3.6.1 Vacinas de vetor recombinante

3.6.2 Vacinas de DNA nu

4 - Adjuvantes

4.1 Alúmen

4.2 Adjuvantes à base de óleo ou lipídio

4.3 Ligantes de PRR (receptores de reconhecimento padrão )

5 - Razões para não vacinação

6 - Consequências da não vacinação

7 - Efeitos colaterais da vacina: os fatos

1 - Introdução

1.1 Estado da arte: vacina contra SARS-COV-2

2 - Planejamento de uma vacina

2.1 Natureza do Patógeno

2.2 Eficácia

2.3 Segurança

3 - Tipos de vacinas

3.1 Vacinas Vivas Atenuadas

3.2 Vacinas mortas

3.3 Toxóides

3.4 Vacinas de subunidade

3.4.1 Vacinas de subunidade de proteína

3.4.2 Vacinas de subunidade de polissacarídeo

3.4.3 Vacinas conjugadas

A erradicação da peste bovina

Patógenos intratáveis ​​podem ser um problema tão terrível para os animais (e, portanto, para as pessoas que dependem deles) quanto para os humanos. Campanhas veterinárias não muito diferentes da iniciativa bem-sucedida de erradicar a varíola também podem ser realizadas para eliminar doenças animais. Um bom exemplo é o Programa Global de Erradicação da Peste Bovina, que foi iniciado na África para impedir a infecção e a morte de centenas de milhões de bovinos, búfalos e ungulados selvagens que ocorreram em epidemias regulares desse patógeno. A peste bovina é um vírus que faz com que o animal infectado desenvolva febre, lesões orais e diarréia que logo o matam. A doença se concentrou na Ásia em meados de 1800, mas surtos de “Peste do Gado” tornaram-se comuns na Europa, Oriente Médio e África após o desenvolvimento do transporte por trem a vapor e a importação de gado asiático e russo. Na África, os efeitos foram particularmente devastadores, pois a população dependia do gado não apenas para alimentação, mas também para levar seus produtos ao mercado. A primeira grande pandemia africana na década de 1890 matou quase 90% do gado na África, e surtos mais localizados de peste bovina continuaram a causar perdas terríveis por mais cem anos. 

Na década de 1920, veterinários imunologistas da Índia desenvolveram uma vacina baseada em um vírus atenuado da peste bovina. Esta vacina podia ser liofilizada e amplamente utilizada, mas tinha a desvantagem de ter de ser produzida em cabras vivas. Na década de 1960, imunologistas veterinários no Quênia encontraram uma maneira de produzir a vacina em culturas de células. Refinamentos posteriores resultaram em uma vacina que poderia ser transportada em temperatura ambiente por 30 dias, dispensando a necessidade de refrigeração. Também foi fortuito que a peste bovina fosse um candidato ideal para erradicação por vacinação em massa, porque havia apenas uma cepa do vírus da peste bovina, nenhum estado de portador existia e imunidade vitalícia ao vírus desenvolvida após a exposição. Uma série de campanhas internacionais para vacinar um grande número de animais em muitos países se seguiram na década de 1970 e houve progresso, mas pequenos grupos de ungulados selvagens infectados persistiram em partes da África. Como resultado, uma segunda grande pandemia de peste bovina africana ocorreu na África subsaariana no início dos anos 1980. 

A Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) das Nações Unidas, que esteve envolvida nos esforços de controle da peste bovina desde a formação da FAO em 1945, então liderou a Campanha Global de Erradicação da Peste Bovina, que evitou a vacinação em massa indiscriminada e se concentrou nas áreas onde a vírus foram identificados ou suspeitos de estarem escondidos. Todo o gado que cruzou a fronteira nacional foi vacinado, e os agentes comunitários de saúde animal imediatamente distribuíram vacinas nos locais onde ocorreram pequenos surtos. Finalmente, no final da década de 1990, após vários anos em que nenhum surto de peste bovina foi relatado, o vírus voltou a aparecer no gado de uma única tribo sudanesa. Depois que todos os animais pertencentes a esta tribo foram vacinados, a cadeia de transmissão foi interrompida nesta parte da África. Os últimos casos de peste bovina foram detectados em búfalos no Parque Nacional Meru, no Quênia, no final de 2001. Após a vacinação desses animais, nenhum outro relato de peste bovina foi recebido, apesar da intensa vigilância e das interrupções causadas por desastres naturais e guerra. Em 8 de agosto de 2011, as Nações Unidas declararam que a peste bovina foi oficialmente erradicada, tornando-se a segunda doença na história a ser completamente eliminada.

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